quarta-feira, 30 de maio de 2012

AS VERDADES ATÉ AGORA ESCONDIDAS POR MEDO… “in memórias do tempo”.

António Indjai ordenou o assassinato de Nino Viera, como sendo um acto de vingança pela morte de Tagme Na Wae e não só...

Mais ainda…Hélder Proença, Faustino Imbali, Roberto Cacheu, com quem contactaram para darem um golpe…nada mais, nada menos do que António Indjai.

Será que há um guineense minimamente honesto que não se recorda das afirmações várias vezes produzidas pelo ex-Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Tagme Na Waié, que dizia em alto e em bom som, frases como estas: “…si Nino matam parmanhã, ditardi ina murri… si matan di tardi, dinoti ina murri… si matam dinoi, mandrugada ina murri… si matan mandrugada, parmanhã ina murri…(se Nino me matar no período da manhã, ele morrerá à tarde… se ele me matar à tarde, morrerá à noite… se me matar à noite, morrerá de madrugada… se me matar à madrugada, morrerá de manhã…).

Se notarem bem, há sempre um período de tempo entre a hora do crime e a hora de vingança. Isto significa que o Batalhão de Mansoa e o seu Comandante já tinham sido instruídos para materializar a vingança. Entre a notícia da morte, a preparação, a viagem de Mansoa para Bissau e a consumação do acto, havia já sido delineado um tempo limite… “…parmanhã---di tardi…” etc, etc..

Vamos passar aos factos.

Os autores materiais do crime, todos eles são militares pertencentes, à data do assassinato do Presidente Nino Vieira, ao famigerado Batalhão de Mansoa, que estava sob o comando do então Coronel António Indjai e são, nomeadamente, os senhores:

1.  Major Martinho Djata
2.  Alferes Buan Nan Dum
3.  2º Sargento Solnate N´Cuiá
4.  2º Sargento José Arimi
5.  2º Sargento Bukuti Tchudá
6.  Furiel Wassate Besna
7.  Cabo Binhan Nan Kina

Estes sete militares sob as ordens do então Coronel António Indjai, só tiveram uma contradição entre eles. Quatro deles diziam terem sido transportados numa carrinha dupla-cabine de cor branca de Mansoa até ao edifício da ANP, enquanto outros diziam ter feito o mesmo trajecto de Mansoa até ao QG e outros diziam até uma mesquita…

Contudo, pelas declarações produzidas nas audições, há certezas absolutas nos depoimentos de todos eles e vejamos as coincidências:

·        não negam que saíram de Mansoa para Bissau na noite do assassinato de Tagme Na Waié;

·        não negam pertencerem todos eles ao Batalhão de Mansoa;

·        não negam terem sido transportados numa carrinha dupla-cabine afecta ao Batalhão de Mansoa;

·        não negam que António Indjai era o Comandante do Batalhão de Mansoa;

·        não negam terem baleado o ex-Presidente Nino Vieira;

·        negam serem eles que esquartejaram brutalmente o ex-Presidente Nino Vieira;

·        afirmam que foram outros militares esquartejaram brutalmente o ex-Presidente como um acto de ajuste de contas;

Há ainda outros dados interessantes. Basta rever as primeiras imagens captadas nas primeiras horas de longe pelas camaras da RTP África e teledifundidas para se ver quais os militares que saíam e entravam na residência do ex-Presidente. Um deles era o então Major Tcham Na Man, saíndo da residência de Nino Vieira e jogando fora uma garrafa de cerveja na rua…

Outro importante dado a ter-se em conta é o facto dos advogados que trabalharam na defesa dos seus clientes nestes processos, por diversas vezes frisaram que em todos os depoimentos e audições levadas a cabo nunca o nome de Carlos Gomes Júnior foi uma vez mencionado.

Recorde-se que em 2010, um Relatório de Direitos Humanos divulgado pelo Departamento de Estado norte-americano atribuía a morte do antigo Presidente guineense Nino Vieira, em março de 2009 por "soldados sob o comando do Coronel António Indjai". O relatório do Departamento de Estado norte-americano começa por lembrar que durante 2010 “não houve qualquer evolução nos casos dos homicídios de 2009 do antigo Presidente Vieira e do ex-chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas o general Batista Tagme Na Waié".

De 2010 a esta data, as organizações internacionais dos direitos humanos continuam a questionar as autoridades guineenses sobre a não evolução das investigações dos homicídio ocorridos na Guiné-Bissau, facto que levou ontem o Dr. Edmundo Gomes, Procurador-Geral da República da Guiné-Bissau a anunciar numa conferência de imprensa que o “processo do assassínio do ex-chefe das Forças Armadas da Guiné-Bissau Tagmé Na Waié está concluído e pronto para julgamento e o do antigo Presidente Nino Vieira em fase de conclusão”

Edmundo Mendes disse numa conferência de imprensa em Bissau que a investigação do processo sobre a morte de Nino Vieira (assassinado horas depois do atentado à bomba contra Tagmé Na Wae, em Março de 2009) "está numa fase irreversível de quase 90 por cento".

Sabe-se que uma alta patente militar, que por razões de respeito e ética, não mencionámos o seu nome, assumiu ele mesmo a autoria moral e operacional do assassinato de Tagmé Na Waié e exemplificou como concebeu e montou a bomba a partir da utilização de um sistema de controlo remoto de um ar-condicionado e da utilização de explosivos, cuja potência destruiu uma parte substancial do prédio onde funcionava o Estado-Maior General das Forças Armadas. Também se conhecem as pessoas que transportaram a bomba e os que acionaram o controlo remoto.

Numa atitude de coragem, de ética, de moral elevada, de dignidade, o PGR da Guiné-Bissau relembrou aos guineenses que de nada servem levar-se a cabo acusações sem a apresentação de provas que possam ajudar a justiça a levar por diante o seu trabalho. Edmundo Gomes dava uma resposta indirecta aos detratores do Primeiro-Ministro Carlos Gomes Júnior, vindos por parte de um sector balanta do PRS e do Comando Militar, com particular realce, por parte do Tenente-Coronel e membro do Comando Militar Dabana Na Walna.

Pelas poucas considerações aqui expostas, podemos avançar que o argumento, o relativo aos “crimes” do Primeiro-Ministro, também ele é um argumento falso, porquanto, sabem-no os militares tão bem como certos políticos, que nenhuma acusação formal existe contra o Primeiro-Ministro, nem nunca o Primeiro-Ministro teve poder para impedir qualquer tipo de investigação ou processo contra ele.
Este argumento prova à saciedade e a promiscuidade existente entre certos partidos e certos políticos e os militares golpistas, porquanto estes apenas vêm reintroduzir argumentos já utilizados até à exaustão contra Carlos Gomes Júnior por políticos e por partidos políticos. A prova desta promiscuidade foi ainda revelada pelo claro envolvimento de civis e políticos no golpe de Estado de 12 de Abril, alguns exibindo-se mesmo com fardamento militar e armas de fogo em alguns bairros de Bissau.
Ousamos perguntar?
Ø No reinado do Presidente Nino Vieira, Carlos Gomes Júnior enfrentou-o directamente sobre a famosa questão das “casas” que o ex-Presidente dizia pertencerem-lhe. Será que Carlos Gomes Júnior tinha mais poder que Nino Vieira, a ponto de impedir que este recolhesse e apresentasse as provas existentes contra si?
Ø Não foi o Primeiro-Ministro Carlos Gomes Júnior demitido por Nino Vieira?
Ø Então quem é que tinha mais poderes?
Ø No reinado do falecido Presidente Malam Bacai Sanhá, o Procurador-Geral Amine Saad estava sob a dependência de Carlos Gomes Júnior?
Ø Ele não foi nomeado com o firme propósito de investigar e levar à justiça os executantes e mandantes dos crimes que vitimaram Tagme Na Waié e Nino Vieira?
Ø Carlos Gomes Júnior tinha poderes para impedir a investigação?
Ø Aliás, quem não sabe quem foram os executores do vil assassinato de Nino Vieira?
Ø Porque é que não se conclui o inquérito sobre o assassinato do General Tagme Na Waié, quando até a reconstituição do crime foi feita pelo próprio autor confesso?
Expandiu-se propositadamente a ideia de que o Primeiro-Ministro gozava de proteção especial de Zamora Induta, Chefe do Estado-Maior que sucedeu a Tagme Na Waié.
Ø Afinal Zamora Induta tinha algum poder real?
Ø Mesmo admitindo que sim, será que após o seu afastamento o novo “poder militar” impediu a investigação dos crimes de que eram acusados?
É bizarro e, sobretudo, contraditório.
Face ao ódio que verificamos existir contra Carlos Gomes Júnior, provindo de sectores civis e militares que controlam o poder real, não temos a menor dúvida que se existissem provas contra ele, há muito tinha sido julgado e condenado.
Aproveitando este pequeno esclarecimento e informação que considero como útil e saudável para os guineenses retirarem as suas próprias ilações, penso que é deveras importante reproduzirmos um trabalho de valor excepcional levado a cabo por um Guineense que se bate de forma decidida e corajosa pela justiça, legalidade e dignificação dos guineenses.
Refiro-me ao Fernando Csimiro, mais conhecido por “Didinho” que a 16 de Julho de 2010, manteve uma conversa interessante e muito importante para ajudar a justiça guineense a encontrar os responsáveis pelos assassinatos que têm envergonhado o nosso país.
Eis o artigo em questão, publicada no blog do Didinho:
À CONVERSA COM O CAPITÃO PANSAU INTCHAMA
a passada sexta-feira, 16.07.2010, no meu trajecto por Mafra, encontrei-me com o Capitão Pansau Intchama. Não o conhecia pessoalmente, mas como falamos por telefone várias vezes, encontrando-se ele nesse dia em Mafra e estando eu de passagem, proporcionou-se um encontro, há muito desejado.
Tive conhecimento de que Pansau Intchama se encontrava em Portugal no dia 04.04.2010 e desde então, temos falado por telefone com alguma regularidade.
A 12 de Dezembro de 2009 escrevi um texto intitulado "A PULSEIRA...", no qual relatei o que em Bissau se tem dito sobre a sua participação no assassinato do ex-Presidente da República, o General João Bernardo "Nino" Vieira. Fiz questão de lhe dizer que tinha escrito esse artigo e ele tranquilamente respondeu: "Sim, é o que se diz por aí...".
Pansau Intchama é um jovem, nascido em 1979, bem-disposto, muito lúcido, que denota muita preparação psicológica, fruto da sua formação militar. Não é fácil conseguir obter dele informações precisas que a ética e a disciplina militar impõem como assunto estritamente de ordem militar.
Por diversas vezes tentei "sacar" dele informações e confissões sobre as matanças de 01 e 02 de Março de 2009, mas também, sobre o envolvimento das altas chefias militares e outros, no narcotráfico.
"Sabes, sou militar, sobre essas coisas não falo...". Respeitei sempre a sua "recusa" em falar, mas na sexta-feira, 16 de Julho, dia em que concluiu o Curso de Promoção a Capitão de Infantaria - CPCI - Curso General Luís Augusto F. Martins, realizado em Mafra de 11.01.2010 a 16.07.2010, consegui saber algo mais do que sabe Pansau Intchama, considerado testemunha-chave, a par de Isabel Romano Vieira, do assassinato do ex-Presidente Nino Vieira.
Pansau recebeu-me no jardim em frente à Porta de Armas da Escola Prática de Infantaria, aí conversamos um pouco e depois convidou-me a entrar para visitar a EPI.
Pude constatar que conhece os cantos à casa e que é bem tratado por todos. Fomos ao bar beber qualquer coisa e de seguida, fez questão que jantasse com ele. Surgiu no entanto um outro militar timorense que tinha frequentado o mesmo curso que ele e jantamos os 3 .
Continuamos a falar da Guiné e dos militares; da necessidade de os nossos militares frequentarem cursos de oficiais e outros, no âmbito da capacitação dos recursos humanos em particular e da modernização das nossas Forças Armadas em geral.
Terminado o jantar, dirigimo-nos para o quarto onde está instalado e que partilha com um militar cabo-verdiano, do mesmo curso, com quem também falei.
Pansau ligou o seu portátil e mostrou-me imagens fotográficas e vídeos do seu casamento, realizado em Janeiro deste ano, dias antes de viajar para Portugal a fim de frequentar o curso de promoção a capitão de infantaria, curso este proporcionado pelos acordos de cooperação militar entre Portugal e a Guiné-Bissau e abrangente a outros países da CPLP.
Foi o António Indjai quem fez questão que eu me casasse antes de viajar para Portugal, disse-me ele, acrescentando que foi assessor de António Indjai durante 7 anos!
Na verdade, ele tinha-me como um filho!
Das muitas imagens que vi, pude concluir que Pansau Intchama era (até Janeiro de 2010) muito estimado pelas chefias militares.
Pude ver no seu rosto, muita ansiedade, reflectindo, naturalmente, saudades da família que se encontra em Bissau: a esposa e os seus filhos, um casal de gémeos.
Então Pansau, sempre voltas para a Guiné-Bissau, mesmo sabendo que corres risco de vida, por tudo o que se tem dito a teu respeito? Questionei-lhe mais uma vez, a ver se lhe conseguia surpreender e obter algo que me ajudasse a juntar mais dados sobre o que penso e já escrevi em relação às matanças de 01 e 02 de Março de 2009.
Sim, estou disposto a regressar e já agora, faço questão que saibas que, contrariamente ao que dizem na Guiné, não fugi e, se estou em Portugal, isso é do conhecimento das nossas autoridades, pois vim fazer especialização desde Janeiro e o levantamento militar aconteceu a 01 de Abril.
Para confirmar-te que as nossas autoridades sabem onde estou e o que vim fazer, vou telefonar agora mesmo ao General António Indjai e vais ouvir a nossa conversa.
Telefonou, no modo alta-voz e pude ouvir, do outro lado da linha alguém atender.
- General, i ami Pansau! General, sou eu o Pansau!
Ah, Pansau, cuma ku sta?! Ah, Pansau, como é que estás?!
Pude ouvir a voz do António Indjai, tal e qual a da gravação contendo as ameaças proferidas no dia 01 de Abril passado. Porém, desta vez era uma voz calma, muito calma mesmo.
Da conversa tida entre eles, o Capitão Pansau Intchama fez questão de dizer ao actual Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, António Indjai que, tal como lhe dissera há cerca de 1 mês, o seu curso acabava e acabou nesse dia, 16 de Julho e que, por isso, aguarda o Bilhete de passagem de regresso ao país, sendo que, já não tem direito a ficar alojado nas instalações da EPI, pois a sua formação tinha chegado ao fim...
Do outro lado, o General António Indjai respondeu mais ou menos desta forma: "Tem calma, o Ministro vai resolver isso, tens que aguardar. Olha, os teus colegas que estão em Angola a receber formação, estão bem piores e até choram..."
Aguardar até quando, General? Perguntou Pansau Intchama, para a ligação terminar aí...
Se dizem que sou criminoso, então que me enviem o bilhete de passagem para eu regressar e ser julgado pelos crimes que me acusam, disse-me de seguida Pansau Intchama.
Afinal, por que razão os deputados guineenses e outras autoridades nacionais continuam a afirmar desconhecer o paradeiro do Capitão Pansau Intchama, ele que chegou a ir à nossa Embaixada em Lisboa tratar de assuntos pessoais?!
Afinal, por que razão algumas vozes acusam Portugal de dar protecção ao Capitão Pansau Intchama, quando, na verdade, todos sabem desde quando Pansau Intchama saiu da Guiné, com destino a Portugal e, ao que veio...
Confrontei o Capitão Pansau Intchama com notícias publicadas em diversos órgãos de Comunicação Social, dando conta de que o Procurador-Geral da República, Dr. Amine Michel Saad estaria interessado e empenhado em ouvi-lo, por ter sido considerado testemunha-chave do assassinato do ex-Presidente Nino Vieira.
Levantou-se e foi buscar 1 exemplar do Semanário "Última Hora", Edição Nº 89, de 16.06.2010, publicado em Bissau, que fala precisamente sobre o assunto.
Pansau Intchama, pelos vistos, está bem informado e documentado sobre o que se diz dele.
Talvez abalado por tudo isso, se tenha deixado embalar na conversa que fui puxando até chegarmos ao seguinte:
Pansau, onde estava António Indjai na madrugada em que o ex-Presidente Nino Vieira foi assassinado?! Perguntei.
- Hum, onde achas que devia estar?!
É assim Pansau, acusam-te de seres criminoso, de teres participado na morte de Nino Vieira, sabem que estiveste lá, mas certamente, digo eu, não estavas sozinho...
Olha, sou militar, como militar respeito os meus superiores e cumpro as suas ordens.
Estávamos, estivemos todos em casa do ex-Presidente Nino Vieira nessa noite. O nosso Comandante era o António Indjai. Um militar cumpre ordens do seu superior hierárquico...
Por que não falam do Major Tcham Na Man, questionou, dando a entender que foi este oficial, aliás, referenciado na altura, quem teve maior participação na morte de Nino Vieira.
De seguida, disse-me: Se não fosse a minha pronta intervenção, o grupo de militares que aí estava teria violado a esposa do Presidente! Eu é que a tirei das mãos deles e disse-lhe para ir embora, ao que respondeu: obrigado nha fidjo. Obrigado meu filho.
Que relação existe entre o duplo assassinato de Tagme na Waie e Nino Vieira, perguntei.
O assassinato de Tagme Na Waie, tem a ver com o narcotráfico, com os aviões que até hoje estão no aeroporto de Bissalanca...
Mas isto quer dizer que, as disputas provocadas pelo controlo do narcotráfico, entre Tagme Na Waie e Nino Vieira ditaram a morte do Tagme e que de seguida houve um aproveitamento estratégico de pessoas interessadas na tomada do poder e que incitaram os militares a vingarem-se, assassinando o ex-Presidente Nino Vieira, por, alegadamente se atribuir a ele a autoria moral do assassinato de Tagme Na Waie?
Ainda temos mais esclarecimentos a fazer sobre os assassinatos de Hélder Proença e Baciro Dabó, que em tempo oportuno daremos algumas informações pertinentes e úteis.
Também vamos falar dos assassinatos ocorridos no triste e famigerado caso conhecido por “17 de Outubro” onde foram assassinadas com feroz brutalidade a nata das Forças Armadas Guineenses (Paulo Correia, Braima Bangurá, N´Foré Bitna e tantos outros grandes e heroicos Combatentes da Liberdade da Pátria), sob o directo comando e envolvimento de Nino Vieira e dos seus homens de mão na altura: Anssumane Mané, João Monteiro, Afonso Té, Joaquim Furtado e tantos outros ferozes assassínos…onde também se incluem políticos (lubu tá kumé lubu…)
Os assassinatos de Veríssimo Correia Seabra, Domingos Barros também serão aqui relatados…
Os guineenses saberão quem são na verdade os mandantes e os autores materiais desses horrendos assassinatos.
A verdade é como azeite em água…por mais que se misture não há osmose entre eles…

domingo, 27 de maio de 2012

DOSSIER: NARCO NA GUINÉ-BISSAU

PROCESSO REFERENTE ÀS AERONAVES RETIDAS NO AEROPORTO “OSVALDO VIEIRA”

 A.  OS FACTOS E CONSIDERAÇÕES

No dia 17 de Julho de 2008, o Governo foi informado entre outros, dos seguintes factos:

1.  Que encontravam-se estacionados no Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira duas aeronaves;

2.  Que tratava-se de voos não programados;

3.  Que, junto ao primeiro aparelho que aterrou em Bissau, foi criada uma linha vermelha por militares;

4.  Que foram desautorizadas todas as autoridades aeroportuárias de se abeirarem desse avião (N351SE), inclusive a brigada da Polícia Judiciária aí colocada;

5.  Que o avião N351SE descarregara aproximadamente 400 ou mais malas e o Comandante Papa Camará referiu tratar de medicamentos para os militares;

6.  Que, para além de Papa Camará, assistira à descarga Leonardo, outro elemento da hierarquia militar;

7.  Que as malas descarregadas assemelhavam-se às apreendidas pela Polícia Judiciária numa operação de combate à droga, existindo fortes suspeitas relativamente ao conteúdo;

8.  Que a segunda aeronave possuía pavilhão nacional e veio para reparar uma avaria técnica da primeira.

O Primeiro-Ministro convocou uma reunião de urgência, tendo-se deliberado reter as duas aeronaves, na base do seguinte:

1.  O desconhecimento da proveniência dos dois aparelhos;

2.  O desconhecimento do conteúdo da carga;

3.  Existência de suspeitas sérias relativamente aos dois pontos anteriores.

O Primeiro-Ministro deliberou ainda entregar a guarda das aeronaves à responsabilidade da Chefia de Estado Maior das Forças Armadas, atendendo ao lapso de tempo ocorrido desde a primeira das aterragens, dia 12, à data do conhecimento da situação. O que, ainda que não necessariamente, fazia recair algumas suspeitas sobre as autoridades aeroportuárias e policiais colocadas no Aeroporto.



Enquanto único titular da acção penal, o Ministério Público, considerando duvidosa a existência das aeronaves no nosso Aeroporto Internacional, com fundamento de que a aterragem não constava de Plano de voo e que existiam suspeitas relativamente à carga transportada, deu inicio ao procedimento criminal e, exercendo as suas competências através da Polícia Judiciária, em Despacho de 19.07.08, ordena e autoriza buscas, revistas, a detenção dos suspeitos, a apreensão das aeronaves e outras diligências conforme.

II.   COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Relativamente ao tráfico de droga e à criminalidade organizada, a Guiné-Bissau ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre Estupefacientes de 1961, a Convenção das Nações Unidas sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971, a Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, a Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional e os respectivos protocolos suplementares sobre o tráfico de pessoas e o tráfico ilícito de migrantes.

No âmbito do Programa Operativo “Prevenir e Combater o Tráfico de Droga”, o Governo estabeleceu como seu parceiro privilegiado e assistente na execução do Plano a UNODC – Escritório das Nações Unidas contra as Drogas e o Crime, que surge em acréscimo às parcerias e cooperação estabelecidas pelas polícias guineenses, quer a nível internacional, quer bilateral.

Nestes pressupostos, mormente o disposto nos artigos 7.º e 10.º da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, sobre o auxílio judiciário mútuo e a cooperação internacional, fundamentam-se os seguintes actos:

1.  Pedido de Localização e apresentação de Carmelo Vásquez Guerra da SubProcuradoria de Investigação Especializada em Delinquência Organizada – Unidade Especializada de Investigação de Delitos Contra a Saúde (México) dirigido à Directoria Geral da Polícia Judiciária – 23.07.08;

2.  Despacho e Mandato de Busca, Revista e Apreensões do Ministério Público – 23 e 24.07.08. Que se refere à colaboração de peritos internacionais na investigação do caso, apontando para a possibilidade de serem utilizados materiais sofisticados, inclusive, a ajuda de cães especializados.

3.  Relatório da Interpol BCN/Bissau sobre a Missão da Interpol na Guiné-Bissau – 29.07.08. Que se refere ao envio pela OIPC-Interpol de elementos do Secretariado-Geral, um agente da DEA, um agente da FBI, dois elementos da GNR-Portugal; estes últimos acompanhados de dois cães treinados.

4.  Mandato Vermelho Internacional de Captura de Vasquez Guerra emitido pela Interpol Internacional – 09.08.08. Avisando de que se trata de pessoa violenta, em fuga, e fornecendo informações sobre os fundamentos da perseguição judicial.

5.  Pedido de Assistência Mútua em Matéria Penal do Ministério Público da Venezuela, sobre o avião N351SE apreendido e proveniente da Venezuela e sobre três venezuelanos: António Carmelo Vasquez Guerra, Carlos Luís Justiniano Nunes e Daniel Agudelo Acevedo – 11.08.08.

6.  Pedido de Extradição de Carmelo Vasquez Guerra da Subprocuradora de Investigação Especializada em Delinquência Organizada – Unidade Especializada de Investigação de Delitos Contra a Saúde (México), dirigido à Ministra da Justiça, nos termos do art. 6.º/3 da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988 – 18.08.08.

7.  Comunicação do Governo dos Estados Unidos da Visita de Porta-aviões USS Theodore Roosevelt às águas internacionais da costa da Guiné-Bissau – 29.09.08. Felicitando os esforços dos membros do Governo guineense no combate ao narcotráfico e apoiando os homens e mulheres e as Forças de Segurança engajados nessa luta.

III. FORTES INDÍCIOS DE DELITOS GRAVES EM PRESENÇA

 1.    ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA

 A difícil situação socioeconómica do nosso país, associada à sua posição geoestratégica na costa Ocidental Africana, a falta de mecanismos institucionais e a sua fraqueza operacional para prevenir e combater o tráfico de droga e outras formas transnacionais de crime organizado, traduzindo-se em sérios obstáculos para a estabilidade política e o desenvolvimento socioeconómico do País, são igualmente factores susceptíveis de continuar a atrair organizações de crime organizado, agravando, ainda mais, a situação actual.

As apreensões e operações feitas pela polícia em 2004, 2005 e 2007, e os relatórios de organismos internacionais, sugerem não só a presença de grupos latino – americanos de tráfico de droga no país, mas também o escalonamento das suas actividades e uso do nosso país como um centro de armazenamento de cocaína, ocorrendo esse tráfico tanto por mar como pelo ar. A estes, juntam-se grupos organizados de criminosos nigerianos, envolvidos no tráfico de droga que, cada vez mais, têm utilizado a Guiné-Bissau como um ponto de partida e fornecedor de indivíduos que são usados como “mulas”, segundo designação corrente.

Ora, no caso em presença, estamos perante a descida em território nacional de um avião pilotado por dois cidadãos estrangeiros, de nacionalidade venezuelana. Encontrando-se a aguardá-los em terra um outro, da mesma nacionalidade e residente em Bissau.

Sem qualquer desprimor ou preconceito relativamente à presença destes cidadãos no nosso país, o certo é que a imigração e visitas dos latinos americanos, designadamente colombianos e venezuelanos, coincidem com o aumento da utilização da Guiné-Bissau como local de trânsito da cocaína produzida no Sul do Continente Americano; ademais, não conhecemos neste país qualquer investimento de vulto, e nem sequer ínfimo de sul-americanos. O que, só por si, implicaria uma investigação minuciosa sobre quais os objectivos das suas presenças e incursões no nosso território nacional.

Corroboram estas convicções e evidências o pedido vindo da SubProcuradoria de Investigação Especializada em Delinquência Organizada – Unidade Especializada de Investigação de Delitos Contra a Saúde (México), dirigido à Directoria Geral da Polícia Judiciária, de localização e apresentação de Carmelo Vásquez Guerra, o piloto da aeronave de porte maior (N351SE), que aterrou em Bissau em 23.07.08.

O pedido atesta que o piloto indicia já ter transportado por ar e introduzido no México a quantidade de 5.5 toneladas de Clorhidrato de cocaína, conjuntamente com o irmão, Miguel Vázquez. Sendo que este último, já se encontra sob a tutela das autoridades mexicanas e sujeito a processo penal.

A presença da criminalidade organizada e associação criminosa, concretamente redes de traficantes estabelecidas no nosso país, é comprovada por outros documentos, designadamente: as informações da Interpol Internacional sobre Vasquez Guerra (21.08.08) e o Relatório da Interpol OIPC/ICPO sobre telemóveis dos suspeitos (Setembro 2008). Mas, outrossim, atestam nesta percepção, as contraditórias declarações obtidas dos três suspeitos estrangeiros, venezuelanos, detidos pela Polícia Judiciária, produzidas entre os dias 19 a 22.07.08. Porquanto, são elucidativas da tentativa de falseamento dos factos, com o objectivo de desvirtuar quaisquer ligações pessoais, interconexões a associações criminosas, ou a pertença a redes criminosas internacionais. Exemplificando, enquanto Daniel Agudelo Acevedo, residente em Bissau, diz: ter sido contactado pelo patrão em Espanha, para ir buscar dois hóspedes que traziam medicamentos, para destino não explicado; que Carlos Luís Justiniano Nunes telefonou a pedir para ir buscá-los ao Aeroporto; que ele assim fez e alojou-os no Malaika e 24 de Setembro. Contrariamente Carlos Luís Justiniano Nunes, o co-piloto do N351SE, diz jamais ter contactado Daniel Agudelo Acevedo.

Sem prejuízo do pedido de Extradição, requerido nos termos do art. 6.º/3 da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, a associação criminosa é um crime punido no nosso sistema penal: quer na generalidade, com previsão de pena de prisão de três a dez anos, nos termos do art. 207.º Cód. Penal; quer na especialidade de crime ligado à droga, com previsão de pena de prisão de quatro a dez anos, nos termos do art. 10.º, do Decreto-Lei n.º 2-B/93, de 28 de Outubro – Legislação nacional relativa a estupefacientes (Lei da Droga).

2.   VIOLAÇÃO ESPAÇO AÉREO E USURPAÇÃO DE FUNÇÕES

 A Informação da Companhia Aérea África Air Assistence, de 18.07.2008, é demonstrativa das situações de incessantes violações do nosso espaço aéreo, ainda que seja por contratação para voos charter ou para reparação de avarias noutras aeronaves.

Segundo alguns relatos, ainda recentemente, no nosso território, eram frequentes os voos irregulares, a baixas e medianas alturas, sem aviso prévio nem autorização nenhuma. Esta é precisamente a modalidade utilizada pelas aeronaves dos narcotraficantes. Como regra, desobedecem qualquer ordem das autoridades aéreas, sendo praticamente suicidas pelas centenas de milhares de dólares que recebem por cada voo, utilizado apenas os poucos minutos que se necessitam para aterrar, depositar a carga e descolar.

A anunciada decisão de disparar sobre qualquer avião que penetrasse ilegalmente no nosso espaço aéreo e se negasse a obedecer a ordem de aterragem para ser inspeccionado, não surtiu efeito. Caricatamente porque a aeronave aprisionada foi recebida por militares, conforme declarações dos suspeitos e fotos de homens fardados obtidas durante o desembarque.

Ora, por imperativo constitucional, a única entidade competente para autorizar a aterragem e descolagem de aeronaves no território nacional é o Governo, delegando essa competência aos órgãos administrativos constituídos e existentes com essas prerrogativas.

A gestão do espaço aéreo inerente à soberania nacional compete exclusivamente ao poder executivo [art. 9.º, n.º 1, al. c) e art. 96.º, ambos da Constituição da República]. Ou seja, a soberania administrativa compete ao Governo, que detém o controlo da direcção das actividades administrativas, no estrito cumprimento da legalidade democrática (art. 8.º, n.º 1 e 2 da Constituição).

Consequentemente, o pedido do Estado-Maior da Força Aérea, dirigido à Agência de Aviação Civil da Guiné-Bissau, sem ser avalisado pelo titular da pasta da Defesa Nacional, é inconstitucional e inexistente.

As Forças Armadas devem obediência aos órgãos de soberania, nos termos da Constituição e da lei (art. 20.º, n.º 3). O mesmo é dizer que, em período de paz, não possuem competência para solicitar a aterragem ou descolagem de uma aeronave em solo nacional, indiciando o crime de usurpação de funções públicas (art. 244.º do Cód. Penal). Para não referir, em acréscimo, o crime contra a segurança interior e exterior do Estado e cumplicidade em pirataria (art. 8.º, al. b) e f) da Lei n.º 2/78, de 20 de Maio – Lei da Justiça Militar.

Uma condenação em processo judicial do piloto e co-piloto da aeronave, por violação do espaço aéreo nacional, por aterragem de voo ilícito e não autorizado, provaria e revelaria a determinação firme da Guiné-Bissau de incrementar todas as medidas possíveis para combater o narcotráfico nas imediações do território guineense, na estrita observância do regime nacional e internacional de sobrevoo, no que tange à responsabilidade da Guiné-Bissau em relação ao seu espaço aéreo.

3.   TRÁFICO ILÍCITO DE DROGA

O Pedido de Assistência Mutua em Matéria Penal do Ministério Público da Venezuela, indicia que um avião deslocou de Barcelona (Venezuela) e transportou para a Guiné-Bissau caixas que continham no seu interior aproximadamente 515 kg de cocaína. Trata-se exactamente da aeronave de porte maior, o N351SE, aprisionada no Aeroporto Osvaldo Vieira e pilotada até o nosso país por António Carmelo Vasquez Guerra e Carlos Luís Justiniano Nunes.

Porém, António Carmelo Vasquez Guerra diz nas suas declarações que transportou para Bissau 600 kg de medicamentos, desconhecendo o destinatário.

Para além da punição enunciada no art. 3.º, a): i), da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, a nossa legislação, designadamente a Lei da Droga, prevê e pune o tráfico de cocaína com pena de prisão que pode chegar a 15 anos (art. 3.º e segs.), sendo a cocaína integrada na Tabela II – Quadro I, deste diploma.

Relativamente à segunda aeronave, da Companhia Aérea África Air Assistence, na informação produzida pelo seu Director Técnico, este declara não ser a primeira vez que foi solicitado a vir de Dakar para dar assistências do género. Informa que, desta vez, fez duas viagens, uma no dia 15.07.08, a outra no dia 16.07.08.

Trata-se de um avião com pavilhão nacional, explorado por uma companhia estrangeira, mas da sub-região, que, estranhamente manifesta a seu total desconhecimento da tráfico de droga aéreo na Guiné-Bissau, em desprimor pela política do Governo de combate ao fenómeno. Ora, tanto a cumplicidade como a dissimulação, são crimes que, investigados e provados, são puníveis nos termos do art. 17.º do Cód. Penal e do art. 6.º da Lei da Droga, respectivamente.

4.   OBSTRUÇÃO À JUSTIÇA

De acordo com o que conta de documentos, relatórios e registos, durante todo o desenrolar da investigação, aconteceram actos e factos tipificados como de obstrução a autoridades públicas, impedindo-se frontalmente que exerçam as suas funções legais e que as mesmas se tivessem se desenvolvido normalmente, como habitualmente ocorre em circunstâncias de presumíveis implicados em situações criminais, necessitarem de recorrer a expedientes facilitadores para obstaculizarem o apuramento e descoberta da verdade.

Elenquemos esses actos e situações indiciárias:

a) Criação de barreira intransponível junto ao avião N351SE, à sua chegada

A informação de 17 de Julho dá conta de que, logo após a aterragem do primeiro avião N351SE, “… veio de imediato um aparato militar, com a missão clara de impedir todas as entidades que operam no aeroporto de se aproximar do avião, de revistar as bagagens, criando uma linha vermelha intransponível”; acrescenta ainda, “ A razão do impedimento, segundo o Comandante Papa Camará, que o avião trazia medicamentos para os militares. Portanto era dispensável a presença das demais forças de segurança”.

Nas suas declarações junto à Polícia Judiciária, quer Roberto Dambi, Comandante da guarda-fiscal, quer Roberto Cezar Cabo, também guarda-fiscal, ambos colocados no Aeroporto, referem-se à criação de barreira intransponível junto ao avião N351SE, à sua chegada. Este último explica: “Que ouviu o barulho de avião, como de costume foi para a pista de aviação civil, encontrou com o comandante de nome Roberto Dambi, que disse que o avião aterrou na pista militar e os militares instalaram homens armados e ninguém pode lá chegar e que deve lembrar que uma vez houve tiroteio. Logo regressou para o pavilhão das Alfândegas.”

As fotografias da descarga do avião N351SE, obtidas pela polícia, comprovam a descarga feita por homens fardados.

b) Impedimento da entrada dos cães

O Relatório da Interpol BCN/Bissau, de 29.07.08, sobre a Missão da Interpol na Guiné-Bissau, atesta que foram informados pela Direcção da Imigração do Aeroporto da existência de uma ordem superior, recebida do Ministro da Administração Interna, que proibia a entrada dos cães no território da Guiné-Bissau.

O Relatório da Directoria Geral da Polícia Judiciária, de 31.07.08, explana os mesmos factos, no 5.º parágrafo da página 2.

c) Morosidade na autorização das buscas e vistorias e na audição dos suspeitos militares

O mesmo Relatório da Directoria Geral da Polícia Judiciária, acima referido, é elucidativo da morosidade verificada no cumprimento de diligências da polícia, cujos lapsos de tempo, em processos do género, auxiliam concertações entre os implicados, o desaparecimento dos objectos de crime e desvirtuam a verdade dos factos.

Esses actos dilatórios resultaram do desacordo sobre o lugar da audição dos suspeitos, atendendo ao cargo, das discussões sobre a essencialidade material do tipo de crime indiciado e da não apresentação dos medicamentos recepcionados (pressupostamente 515 kg).

d) Impedimento da vistoria dos aviões, furto de documentos e equipamentos do avião N351SE e abuso de confiança

No avião N351SE não foram encontrados quaisquer documentos sobre a sua identificação.

No dia 4 de Setembro, a guarda das aeronaves passa do Estado-Maior General das Forças Armadas para o Ministério da Administração Interna.

No termo de entrega do avião N351SE, informa-se: “…falta uma das caixas negras do aparelho, a designada “Voice Recorde”, ou seja, o gravador das conversas do piloto”.

Como consequência da conduta irresponsável e inconcebível dos que retiraram os documentos e peças do avião N351SE, julgamos que alguns deles com méritos indubitáveis e antecedentes revolucionários, é posto em risco não apenas o prestígio e a enorme autoridade moral heroicamente adquirida durante luta de libertação pelas Forças Armadas Revolucionárias do Povo, mas também postas em causa instituições vitais de combate ao narcotráfico e crime organizado e, em última análise a própria segurança do país.

A polícia de investigação criminal possui registo audiovisual dos acontecimentos verificados in loco na data da vistoria do avião N351SE.

A nossa lei criminal pune a obstrução à autoridade pública, o abuso de confiança e o descaminho de objectos sob poder público, respectivamente no art. 238.º, 147.º e 248.º do Cód. Penal.

5.   FRAUDE FISCAL E CONTRABANDO

Em Janeiro deste ano, às 12H8mn, aterrou no nosso Aeroporto um aparelho com características S9-DBM, B727-200GC-ETA 051200, que trazia medicamentos para militares. E diz-se que o avião N351SE também trazia medicamentos, supostamente mais de 500 kg.

Qualquer mercadoria entrada em território nacional terá que ser desalfandegada, ainda que possa vir a beneficiar de isenções de taxas, sob pena de contrabando, ou de cometimento de fraude fiscal (art. 36.º do Decreto n.º 33:531, de 19 de Junho de 1944 – Contencioso Aduaneiro; e art. 174.º do Cód. Penal).

Ora, não existe manifesto de carga dos medicamentos, tratando-se de mercadoria não declarada, que indicia crime contra a economia.

Prova para a indiciação criminal e fiscal, são as discrepâncias entre, nomeadamente, as declarações dos suspeitos e os documentos emitidos pelas autoridades nacionais, reportados à proveniência do N351SE, evidenciando, estes últimos: a falsificação de documentos em prejuízo do Estado (art. 199.º do Cód. Penal), a não apresentação das 500 kg de medicamentos e a suspeita utilização de avião do tipo executivo da companhia aérea L.B INC para transporte de medicamentos.

IV.   RESPOSTAS DO SISTEMA JUDICIÁRIO

O nosso sistema judiciário denota falta de capacidade de aplicação de Leis e de resposta atempada aos crimes, no geral, e à criminalidade organizada, em particular. O que salienta o aumento crescente das redes internacionais de tráfico na Guiné-Bissau e a permanente utilização do território nacional, como base de transbordo de grandes quantidades de droga, destinada ao mercado Europeu.

Relativamente à letargia das nossas instâncias judiciárias em processos de droga, entre outras constatações, ela advém da pendência de processo, tais como: o da “Droga posta no Tesouro Público", o dos “Colombianos da SOCOMEC”, o dos “Nigerianos” e, actualmente, do arquivamento do processo em apreço.

Não obstante, os factos e actos supra referidos nos itens anteriores, dos quais obtivemos conhecimento nas nossas funções, os magistrados, interventores e detentores do processo-crime, manifestaram desconhecimento, ligeireza e irresponsabilidade nas suas pronúncias.

Analisemos as decisões judiciais do processo e o acto do seu arquivamento.

1.    DECISÕES JUDICIAIS

No dia 13.08.08, o Juiz de Instrução Criminal, emite Despacho de revogação da prisão preventiva aplicada aos suspeitos António Carmelo Vasquez Guerra, Carlos Luís Justiniano Nunes, Daniel Agudelo Acevedo e Posto Iala Merba; e, correspondentemente, o Mandato de Soltura.

No seu Despacho, o magistrado judicial refere: que o alegado crime despertou alarme social; que pela sua natureza cria fortes suspeitas dos suspeitos terem transportado narcóticos para a Guiné; que o Ministério Público refere-se a obstáculos, resistência e encobrimento. Todavia, contraditoriamente, decide pela libertação dos suspeitos, fundamentando a sua decisão na convicção e consciência de que já não existem quaisquer suspeições.

Não obstante o Despacho do Ministério Público, requerendo a manutenção da prisão preventiva de António Carmelo Vasquez Guerra, fundamentada no mandato de captura internacional vermelho e no pedido de extradição da mesma pessoa, o magistrado emite novo Despacho, em 19.08.08, desvirtuando e descriminalizando o processo com questões secundárias e não essenciais, interpretando de forma duvidosa os dispositivos legais e decidindo-se, pela segunda vez, pela libertação do piloto e co-piloto.

Mais ainda, o Juiz de Instrução Criminal, não se refere à lei especial para o caso, isto é a Lei da Droga, que no seu art. 32.º estabelece que: “Sempre que o crime imputado for o tráfico de droga… e o arguido se encontre preso preventivamente, ao ponderar a sua libertação, o juiz tomará especialmente em conta os recursos económicos do arguido… em termos nacionais e internacionais”. Acrescentando-se: “Antes de se pronunciar sobre a subsistência dos pressupostos da prisão preventiva, o juiz recolherá informação actualizada que possa interessar ao reexame dos pressupostos”.

Evidentemente que a decisão do Juiz de Instrução, de que a prisão preventiva seja substituída por outra medida de coação, nunca chegou a ser cumprida. Porque os suspeitos não foram conduzidos à Polícia para os libertar, como rezava o mandato, antes foram automaticamente postos em liberdade e António Carmelo Vasquez Guerra pôs-se imediatamente em fuga, violando-se o mandato judicial.

Destes actos e decisões judiciais, resultaram tão-somente o afastamento do magistrado, quando, ao invés, o nosso sistema judiciário deveria ter ido muito para além das questões disciplinar e responder adequadamente aos indícios de denegação de justiça, de prevaricação, e quiçá de corrupção, nos termos dos art. 14.º e 15.º, da Lei n.º 14/97, de 2 de Dezembro, e do art. 247.º do Cód. Penal.

Eis esplanada a incapacidade de reacção do Estado e das suas instituições perante o fenómeno e a força económica do narcotráfico, evidenciando a reclamada falta de confiança da população nas estruturas judiciais.

2.    DECISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – ARQUIVAMENTO DO PROCESSO

Enquanto observadores atentos, fomos analisando consternados os actos do magistrado do Ministério Público encarregue do processo. Porquanto, lamentamos a não observância dos prazos para pedido de prorrogação da prisão preventiva, a fundamentação precária dos pressupostos justificativos para a manutenção da prisão preventiva e, sobretudo, a Direcção ineficaz e ineficiente do inquérito.

Contudo, restava uma réstia de esperança de que o Ministério Público, enquanto defensor do Estado e do interesse público em esfera criminal, se revelasse e, neste processo, concluísse pela acusação.

Surpreendentemente, fomos confrontados no dia 05.11.08, com o arquivamento do Processo.

O arquivamento é fundamentado na inexistência de prova indiciária suficiente da verificação do crime de tráfico internacional de estupefaciente (um tipo legal que não obtém enquadramento no nosso ordenamento jurídico), e conclui com a denúncia; cita-se: “da recusa «categórica» de colaboração da Polícia Judiciária, não enviando ao Ministério Público uma única peça sequer dos objectos apreendidos no âmbito do processo, incluindo as fotografias e o Relatório da Interpol Lyon sobre Exames efectuados aos objectos…”.

O magistrado do Ministério Público dá como assente para arquivar o processo o seguinte:

ü Que o avião N351SE provinha da Espanha. Todavia, as declarações dos suspeitos, os documentos das polícias internacionais e das autoridades judiciárias do México e da Venezuela, referem-se à proveniência deste avião de Barcelona (cidade Venezuelana); com dissensões comparativamente aos seguintes documentos: Telecopie ASECNA – Proveniência: Venezuela/Espanha; Raport ASECNA – Proveniência: Venezuela/Barcelona; Relatório do Chefe de Serviços Técnicos da ASECNA – Proveniência: Venezuela/Espanha.

ü Que trazia medicamentos, sem curar apurar a quantidade. Existindo documentos idóneos que se referem a mais de 500 kg de mercadoria. E sem apurar se a Farmácia Valência enviou para a Guiné medicamentos encomendados pelo Hospital Militar das Forças Armadas (de Caracas!!!), através da Direcção dos Serviços de Saúde Militar (Espanha ou Venezuela?).

O responsável pela investigação e acusação do processo, ordena que sejam notificados os lesados (art 205.º do Cód.Penal). Que, entre outros, é o Estado e, concomitantemente, o próprio Ministério Público.

Em acrescendo, contacta-se:

a)  A não indicação no despacho de qualquer disposição do Cód. Penal que eventualmente teriam induzido o inicio da investigação.

b) A violação das regras processuais estabelecidas nos Artsº. 47.º a 50.º e 195.º do Cód. Proc. Penal, que definem os poderes do Ministério Público, os actos da sua competência, os actos a autorizar e a sua legitimidade processual.

c)  A violação do dever de objectividade, que deve orientar a actividade do Ministério Público, com vista à prossecução da verdade e à realização da justiça (art. 52.º do Cód. Proc. Penal).

d) A omissão das discrepâncias das declarações dos suspeitos constantes no processo.

e)  A omissão sobre a constatação in loco de uma carga de mais de 500 kg de medicamentos.

f)   A ligeireza do tratamento adequado e legal da entrada ilícita de cidadãos estrangeiros no país, que confessaram não possuir certificação para o efeito. Ainda que estejamos num foro diferente, que não o criminal.

g) O tratamento inadequado dos vários Relatórios emitidos por instituições/entidades nacionais e estrangeiras responsáveis e idóneas. 

h) A omissão das coincidências e incongruências entre as datas e horas, designadamente: no pedido da Força Aérea, na autorização de aterragem, nas tentativas de partida. Factos constantes nos documentos fornecidos pela ASECNA e pela Agência de Viação Civil.

Ora, as consequências deste arquivamento seriam as seguintes:

1.  Inexistências de quaisquer dos crimes acima referenciados, como sejam: violação espaço aéreo e usurpação de funções, associação criminosa, tráfico ilícito de droga, obstrução à justiça, fraude fiscal, entre outros.

2.  Por inexistência de acusação de tráfico de droga, as prisões dos suspeitos considerar-se-iam ilegais e, reversamente, teriam direito a ser indemnizados.

3.  As aeronaves teriam que de ser libertadas, ainda que se desconheça o proprietário da aeronave que eventualmente terá transportado a droga.

4.  Frustraria definitivamente a investigação e a busca do rasto da mercadoria não declarada, suspeita de ser droga.

5.  De novo abalada a seriedade do Governo guineense no combate ao narcotráfico.

A comunicação da reabertura do processo pelo Ministério Público noticia uma solução final que esperemos seja diversa do arquivamento. E, fazemos fé, que nos sessenta dias estabelecidos, o Ministério Público possa efectivamente exercer as suas prerrogativas constitucionais e inquisitórias, auxiliando-se dos órgãos nacionais e internacionais, mercê da necessidade imperiosa de comunhão de esforços, atendendo à complexidade do processo e para que, neste caso, seja objectivamente descoberta a verdade e se faça Justiça.

B.   PROPOSTA DE SOLUÇÃO

I.   Decisão Judicial em processo-crime

Recapitulemos e tragamos à colação mais dados da questão:

§  Violação de espaço aéreo – Atentado à soberania nacional;

§  Evidência da utilização do território nacional como placa giratória no tráfico internacional de Droga;

§  Plano de emergência do Governo de Combate ao Narcotráfico;

§  Número cada vez maior de guineenses indiciados no tráfico.

§  Número significativo de guineenses condenados no exterior por tráfico;

§  Institucionalização da cooperação internacional e sub-regional no Combate ao narcotráfico.

§  Relatório das Nações Unidas indicadores da dimensão do narcotráfico na Guiné-Bissau.

Como sabemos, a Justiça é um interesse público que em tempos idos estiveram a cargo da Administração Pública. A separação dos poderes “separou” executivo e judicial, com implicações a vários níveis: separação entre órgãos administrativos e judiciais, incompatibilidades das magistraturas, independência recíproca da Administração e da Justiça e a inerente necessidade de cada poder respeitar a autonomia e esfera da actuação do outro.

Uma das grandes linhas orientadoras da actividade da Administração Pública é o interesse público, constituindo a sua razão de existir. A actual Constituição guineense não estabelece expressamente esta conexão entre interesse público e Administração Pública, mas ela indubitavelmente resulta dos princípios fundamentais do texto constitucional. São feitas referências ao “interesse geral” (art. 13.º), à prossecução dos interesses das comunidades (art. 105.º) e constitui princípio fundamental da organização económica e social a “promoção contínua do bem-estar do povo (art.11.º).

Ao Ministério Público compete representar o interesse público e social junto aos tribunais (art. 125.º da Constituição da República).

Nos termos que já nos pronunciamos anteriormente em parecer da Direcção Geral da Política Legislativa e na base das considerações acima tecidas, o Ministério Público deverá prosseguir com as investigações, mercê da imperatividade de acusar o processo, visando a condenação dos suspeitos e dos evadidos, ainda que em revelia e, necessariamente, praticando de entre outros actos, os seguintes:

1.  Remoção os obstáculos que impediram a Polícia Judiciária/Ministério Público de prosseguir com a investigação/inquérito criminal iniciado na sequência da aterragem das duas aeronaves, suspeitas de transporte e cumplicidade no tráfico de drogas

2.  Audição nas instalações da Polícia Judiciária dos intervenientes já identificados que, por sua vez, identificaram todos os restantes militares que participaram na descarga, bem como a entidade que os incumbiu de tal missão; ou seja todos os suspeitos (não evadidos), declarantes e testemunhas, acarreando-os, ainda que sejam militares, pois a lei não outorga a estes últimos nenhuma imunidade no sentido de deverem ser ouvidos nos quartéis.

3.  Análise e comparação minuciosamente dos documentos, informações, relatórios e perícias constantes do processo.


4.  Identificação das viaturas utilizadas, seus proprietários e o local do depósito da carga.


5.  Fazer uso da cooperação judiciária e ajuda mútua dos parceiros internacionais, quer no âmbito da cooperação bilateral, nos termos dos acordos rubricados pelo nosso país; quer no âmbito da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988; quer no âmbito da assessoria da UNODC ao Plano Operativo de Combate ao Narcotráfico; quer no quadro das parcerias sub-regionais, a serem implementadas pela CEDEAO.


6.  Estabelecer o nexo entre o ou os crimes e os meios e materiais usados para a sua comissão, para que os mesmos possam ser declarados perdidos a favor do Estado (art. 141.º e 142.º do Cód. Proc. Penal, art. 82.º e 83.º do Cód. Penal, art. 16.º, n.º 2 e 18.º da Lei da Droga e art. 5.º da Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988).

Conforme referimos, o processo indicia suspeitas sérias e fundadas da comissão de crimes graves, cuja autoria e cumplicidade deverá ser apurada, visando a acusação e condenação por violação do espaço aéreo, usurpação de funções, associação criminosa, tráfico ilícito de droga, obstrução à justiça, fraude fiscal, entre outros.

II.  Diligências processuais urgentes relativamente às aeronaves apreendidas

Em relação aos bens objecto de crime, designadamente as aeronaves, compete outrossim ao Ministério Público representar o interesse público e encetar diligências a título cautelar. Ou seja, impulsionar toda a celeridade processual adequada, visando o efeito útil da acção penal, em defesa e salvaguarda dos interesses dos Estado neste processo, sendo aconselhável e urgente uma, das duas diligências seguintes, ou as duas em simultâneo, como sejam:

1.  Providência Cautelar em Processo-Crime: Obter decisão judicial que ordene o confisco do aparelho à ordem do Estado guineense, demonstrando que os aparelhos encontram-se "vinculados" ao tráfico de droga [Avião N351SE não reclamado – proprietário desconhecido; piloto e co-piloto relacionado com o tráfico (prova documental: telefonemas, mandato de captura vermelha); uso constante das aeronave para o tráfico]. Ou então, pelo menos, o arresto preventivo, nos termos do art. 175.º do Cód. do Proc. Penal.

2.  Acção Fiscal: Obter decisão por infracção fiscal (contrabando) e solicitar seja declarado perdidas as duas aeronaves, nos termos do art. 40.º do Decreto n.º 33:531, de 19 de Junho de 1944 – Contencioso Aduaneiro.

De facto, como sabemos, as duas aeronaves apreendidas correm sérios riscos de degradação pelo tempo de paragem debaixo das intempéries (toda a época das chuvas deste ano), tratando-se o N351SE de um avião de luxo, não reclamado.

Daí que, situação urgente e conexa ao processo-crime, constitui na determinação da solução e do destino dos aviões aprisionados. Posto que, a demora frequente de decisão judicial que decida definitivamente o destino de bens perdidos a favor do Estado, associada às deficientes condições de armazenamento daqueles bens e de outras circunstâncias, como o não uso, contribuem decisivamente para a deterioração e, frequentemente, inutilização antes de chegar a integrar o património do Estado.

Ora, no Processo Civil, a regra geral é de que as providências cautelares sejam requeridas pela via de acções. No Processo Penal é o contrário, ele não tem um objectivo autónomo, é instrumental. O objectivo do processo cautelar varia, porque ele é acessório – ele segue, na sua natureza, um processo que lhe é principal. O processo cautelar garante a efectividade do processo principal, é uma ferramenta que está ao serviço de um outro processo, garante que um outro processo seja efectivo (produza transformação). A ideia não é de eficácia jurídica, mas sim de efectividade (eficácia social). O processo cautelar não é eficaz do ponto de vista jurídico, porque toda sentença válida será juridicamente eficaz (acatada, cumprida).

O que o processo cautelar pretende é reduzir o risco de não ser efectiva a prestação jurisdicional em razão da passagem do tempo. O processo cautelar resguarda o processo principal quanto ao perigo da demora – do fumus boni juris e do periculum in mora.

O processo cautelar está inserido, portanto, dentro da órbita de preocupações que, na Teoria do Processo, se chama genericamente TUTELA DA URGÊNCIA.

Porém, o nosso Cód. Proc. Penal não traz um capítulo dedicado ao processo cautelar, embora o fenómeno da cautelaridade exista no sistema processual penal guineense. Ele só não está organizado, não possui um tratamento sistematizado dentro do Código.

As diferentes possíveis providências cautelares estão dispersas ao longo do Cód. Proc. Penal. Existem providências cautelares na persecução preparatória (quando o Cód. Proc. Penal), nas questões e processos incidentes, na prisão, etc. Elas são tratadas no Código na medida em que se revelam necessárias, reconhecendo e tratando a possibilidade de adopção da providência.

A perda de bens objecto de crime está prevista na Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, cujo art. 5.º, regulamenta os procedimentos para a declaração da perda de bens e as medidas a adoptar pela Partes.

No direito interno o art. 82.º do Cód. Penal, refere-se à perda dos objectos como consequência do crime, que deverão ser declarados perdidos a favor do Estado. Assim como a Lei da Droga, no art. 16.º, considera medida e pena assessoria a perda de bens relacionados com o facto, estabelecendo que os tribunais declaram perdidos a favor do Estado, equipamentos e outros bens móveis utilizados para a prática da infracção.

Mas, repetimos, como verificamos no caso presente, pode acontecer que na passagem do tempo, enquanto transcorre a acção de conhecimento (que é demorada pois precisa atender ao Princípio da Busca da Verdade, ao Princípio da Ampla Defesa e ao Princípio do Contraditório), na passagem do tempo, na hora em que se decretar o confisco, a perda, pode-se já não encontrar mais nada.

Todavia, versam os documentos e provas indiciárias a ocorrência, em tese, de graves crimes, então existe a possibilidade de autorização a tornar indisponíveis, esses bens objecto de crime que podem vir a ser perdidos a favor do Estado.

Tanto mais que é imperioso que não se permita que os bens apreendidos se deteriorem e percam o seu valor económico. Como sabido, tratam-se de objectos perecíveis, que perdem muito do seu valor se sujeito às intempéries do tempo, daí a preocupação em dar-lhe o aproveitamento económico devido, como forma de garantir o cumprimento da finalidade legal.

Veja-se, então, que restam presentes os requisitos exigidos para que se adopte a providência cautelar ora buscada, pois tanto a plausibilidade do direito invocado quanto o perigo na demora afloram claros e tornam a medida imperiosa. 

A medida pode ser determinada ex officio, a pedido do MP.

Por conseguinte, o Ministério Público deverá requerer a alienação antecipada das aeronaves, após a devida avaliação (critério do valor de mercado), depositando-se o quantum apurado em conta judicial até o deslinde do feito.

O Ministério deverá requerer designação de Audiência Preliminar, para a qual deverão ser intimados os proprietários dos bens, ainda que por em citação edital.

Portanto, existindo suspeitas dos bens terem sido utilizados para o crime de tráfico ilícito de drogas, a providência deve ser requerida pelo Ministério Público, e o juiz determinará a avaliação dos bens, notificando as partes para, posteriormente, se for o caso, ordenar a alienação antecipada dos bens, sendo que o recurso contra a decisão proferida terá apenas o efeito devolutivo. Porquanto, ainda que o procedimento não seja regulado de modo autónomo pelo Código de Processo Penal, as normas legais enunciadas, revelam-se cabíveis à alienação antecipada dos bens apreendidos em procedimento criminal, quando sujeitos a riscos de deterioração e desvalorização, ocasionando prejuízo ao Estado. E, por maioria de razões nos casos em que se têm como fim evitar a degeneração, a danificação, para impedir a desvalorização de bens.

Conforme também se referiu, o Ministério Público deverá accionar os mecanismos para que seja instaurada a competente acção penal, nos termos dos Decreto n.º 33:531, de 19 de Junho de 1944 – Contencioso Aduaneiro, ordenando a captura e a manutenção da prisão até final de julgamento, daqueles que forem indiciados como autores, cúmplices ou encobridores de delitos fiscais a que seja aplicável pena de prisão (art. 132.º, n.º 2, do Contencioso Aduaneiro) e a declaração do perdimento das aeronaves por a parte principal da sua carga consistir em mercadorias contrabandeadas e os seus proprietários não provarem que foi sem o seu conhecimento ou sem negligência da sua parte que eles foram utilizados (art. 40.º do Contencioso Aduaneiro).


C.  CONCLUSÃO

As soluções apresentadas revelariam que o Estado/Governo guineense (em colaboração e acção concertada com o Ministério Público) se posicionou e, por amparado nas normas constitucionais, nas convenções internacionais e no direito interno, actuou e actuará com firmeza em defesa da soberania nacional, quando esta for ameaçada por violações ou infiltrações clandestinas, mormente:

·        Tomando as medidas necessárias para evitar que incidentes similares voltem a ocorrer. 

·        Reiterando o respeito à soberania da Guiné-Bissau. 

·       Reagindo adequadamente ao desrespeito à inviolabilidade territorial, que deve e será respeitada, pois as Forças Armadas têm o dever de manter vigente este princípio essencial nas relações internacionais.

·       Reiterando o estrito cumprimento dos compromissos multilaterais sobre o combate ao narcotráfico e seus delitos relacionados, e a vontade política de que continua postando acções para combater este flagelo, uma luta decidida e internacionalmente reconhecida.